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  • quarta-feira, 22 de junho de 2016

    ROUSTAING- UMA ETERNA DESILUSÃO FEBIANA ( JOSE PASSINI, ALTOLFO OLEGÁRIO, LEONARDO MARMO , JORGE HESSEN, PAULO NETO)



    JOSÉ PASSINI
    passinijose@yahoo.com.br 
    Juiz de Fora, Minas Gerais (Brasil) 

                O Espiritismo, na sua condição de Cristianismo redivivo, não poderia deixar de receber os ataques das forças contrárias ao esclarecimento e libertação do espírito humano. Embora pareça um paradoxo, o volume e a intensidade dos ataques constituem um verdadeiro atestado da legitimidade do Consolador.

    A primeira, e talvez a mais forte das investidas, foi a publicação da obra de J. B. Roustaing, conhecida, em língua portuguesa como “Os Quatro Evangelhos”.

    Na obra “Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho”, Roustaing é citado como pertencente à equipe de Kardec. Há aqueles que contestam a autenticidade de tal afirmativa. Entretanto, sabe-se que todo missionário que vem à Terra traz consigo uma equipe, constituída de Espíritos, trabalhadores de boa vontade, mas sujeitos a falhas. Zamenhof veio à Terra com um grupo de Espíritos para a implantação do Esperanto. Dentro dessa equipe, houve um Espírito que falhou. Traiu o grande Missionário, liderando um grupo que apresentou uma versão modificada do Esperanto numa convenção mundial. Sua falha foi tão grande, que foi chamado Judas por uma biógrafa de Zamenhof, tal a repercussão da sua atitude.

    Roustaing, embora tenha reencarnado com tarefa definida junto à obra de Kardec, conforme relato de Humberto de Campos na obra “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”, foi vítima de Espíritos que se enquadram perfeitamente na classificação de Kardec, como Espíritos pseudo-sábios, conforme item 104 de “O Livro dos Espíritos”:

        
    “Seus conhecimentos são bastante amplos, mas acreditam saber mais do que realmente sabem. Tendo realizado alguns progressos sob diversos pontos de vista, a linguagem deles tem caráter sério, que pode iludir quanto às suas capacidades e luzes; porém, na maioria das vezes isso não passa de um reflexo dos preconceitos e das idéias sistemáticas da vida terrestre. É uma mistura de algumas verdades com os erros mais absurdos. Em meio aos quais despontam a presunção, o orgulho, o ciúme e a obstinação, de que não puderam livrar-se.”
          Roustaing desejou produzir obra própria, tornando-se presa fácil de fascinação. Esse não foi o primeiro, nem o último caso, na Humanidade, da falência de um Espírito pertencente a um grupo de trabalho. Judas, da equipe de Jesus, também falhou.

    Esses quatro volumes constituem obra fantasiosa, repetitiva, que, em muitos pontos, contradiz fundamentalmente a Doutrina Espírita. É apresentada em tom professoral, catedrático, que choca frontalmente com a simplicidade, objetividade e limpidez das expressões de Kardec e dos Espíritos que dialogaram com ele.

    As citações que fizermos, respostas dos Espíritos mistificadores que orientaram Roustaing, todas em negrito vermelho serão referentes à edição de 1971 de Os Quatro Evangelhos, que difere um tanto daquela de 1942, da mesma editora, pois que foram suprimidos ataques a Kardec.

    Roustaing pretendeu dar nova versão à tese da virgindade de Maria, através de uma pseudo-gravidez, que teria culminado no aparecimento de um bebê fluídico, surgido de uma gravidez enganosa, de um parto fictício, de uma lactação aparente, de um desenvolvimento físico falso e de uma desencarnação mentirosa.
    “Mas, não o esqueçais: todo aquele que reveste a carne e sofre, como vós, a encarnação material humana – é falível.” (pág. 166).

    Estaria o Espírito querendo dizer que se Jesus encarnasse estaria sujeito a falhar? Por isso não teria encarnado?
    Jesus viveu a vida de um homem normal da sua época: trabalhava, comia, bebia, hospedava-se nas casas das pessoas. Por que mudou completamente seu modo de agir depois da desencarnação? Não há nenhum registro no Novo Testamento que se tenha hospedado em casa de alguém, nem que tenha feito refeições regulares, como fazia. É claro que desejava deixar claro que não mais estava encarnado, que não mais tinha necessidades materiais.

    Seu enquadramento na vida terrena, enquanto encarnado é claramente demonstrada na citação abaixo:
    “E chegando sábado, começou a ensinar na sinagoga; e muitos, ouvindo-o, se admiravam, dizendo: Donde lhe vem essas coisas? E que sabedoria é esta que lhe foi dada? E como se fazem tais maravilhas por suas mãos? Não é este o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de Tiago, e de José, e de Judas e de Simão? E não estão aqui conosco suas irmãs? (Marcos, 6: 2 e 3).

    Mas, embora tivesse poderes para fazê-lo quando encarnado, nunca atravessou portas fechadas, nem apareceu ou desapareceu subitamente, como o fez depois de desencarnado, demonstrando a imortalidade da alma, apresentando-se apenas com seu corpo espiritual:
    “E oito dias depois estavam outra vez os seus discípulos dentro, e com eles Tomé. Chegou Jesus estando as portas fechadas, e apresentou-se no meio deles, e disse: Paz seja convosco.” (João, 20: 26)
    Há outro relato de aparecimento, este com desaparecimento também:
    “E eis que no mesmo dia iam dois deles para uma aldeia, que distava de Jerusalém sessenta estádios, cujo nome era Emaús. E aconteceu que, indo eles falando entre si, e fazendo perguntas um ao outro, o mesmo Jesus se aproximou, e ia com eles. Mas os olhos deles estavam como que fechados, para que não o conhecessem. E chegaram à aldeia para onde iam, e ele fez como quem ia para mais longe. E eles o constrangeram dizendo: Fica conosco porque já é tarde, e já declinou o dia. E entrou para ficar com eles. E aconteceu que, estando com eles à mesa, tomando o pão o abençoou e partiu-o, e lhes deu. Abriram-se-lhes então os olhos, e o conheceram, e ele lhes desapareceu.” (Lucas, 24: 13, 15, 16, 28 a 31).
     Se Jesus não teve um corpo físico, como afirma Roustaing, por que passou a agir de maneira tão diferente depois da sua desencarnação?

    Roustaing tenta apagar a notável lição de Paulo, no cap. 15 da Primeira carta aos Coríntios, onde o Apóstolo fala claramente em corpo físico e corpo espiritual.

    É interessante notar a argumentação de Paulo:

    “Porque se os mortos não ressuscitam, também Cristo não ressuscitou.” (16)

    “Mas alguém dirá: Como ressuscitarão os mortos? E com que corpo virão?” (35).

    “Semeia-se corpo animal, ressuscitará corpo espiritual. Se há corpo animal, há também corpo espiritual.” (44)
    Se Paulo entendesse que Jesus tinha só corpo fluídico, não falaria em ressurreição.

    Àqueles que perguntam sobre o que aconteceu com o corpo físico de Jesus – pois que desaparecera do túmulo – pode-se responder com os trabalhos levados a efeito por equipes de cientistas internacionais que estudaram o pano sobre o qual o cadáver de Jesus foi desmaterializado, pano esse conhecido como o Sudário de Turim. Constitui ele relíquia ciosamente guardada pela Igreja Católica Romana, que retrata a figura de um homem, de frente e de costas, que sofrera flagelações, tudo coincidindo com o que se conhece sobre Jesus. Mas, os cientistas não chegaram a conclusão alguma sobre como fora gravada a imagem. Declaram que não foi pintura, tintura, queimadura por fogo ou por ácido, nem radiação atômica. Sabemos, nós espíritas, que seu corpo foi desmaterializado.

    Entretanto, não é a tese do corpo fluídico o ponto mais grave da obra. Há afirmativas que contrariam frontalmente as bases doutrinárias do Espiritismo. Vejamos algumas, dentre muitas:

    Evolução do Espírito:
                Com Kardec, em O Livro dos Espíritos, aprende-se que o princípio inteligente percorre, durante milênios incontáveis, as trilhas da evolução, antes de atingir o estágio de humanidade. Aprende-se que a consciência moral que caracteriza o ser humano, libertando-o gradualmente do jugo dos instintos, desabrocha lentamente, revelando a perfeição imanente no Ser:
    O Livro dos Espíritos - 607 a. Parece que, assim, se pode considerar a alma como tendo sido o princípio inteligente dos seres inferiores da criação, não?

                “Já não dissemos que tudo em a Natureza se encadeia e tende para a unidade? Nesses seres, cuja totalidade estais longe de conhecer, é que o princípio inteligente se elabora, se individualiza pouco a pouco e se ensaia para a vida, conforme acabamos de dizer. É, de certo modo, um trabalho preparatório, como o da germinação, por efeito do qual o princípio inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito. Entra então no período da humanização, começando a ter consciência do seu futuro, capacidade de distinguir o bem do mal e a responsabilidade dos seus atos. Assim, à fase da infância se segue à da adolescência, vindo depois a da juventude e da madureza.”

                Respondendo a Roustaing, os Espíritos com os quais dialogou, falam numa transformação do instinto em inteligência – num determinado momento – levada a efeito por agentes exteriores e não através do próprio processo evolutivo, o que faz pensar numa espécie de “colação de grau” espiritual. Interessante notar, também, que o Espírito, depois de todas as aquisições individuais retorne ao “todo universal”, onde, certamente, perderia a sua individualidade. Além disso, como teria, um Espírito recém-saído da animalidade ter um perispírito tão sutil a ponto de quase ser invisível aos Espíritos Superiores? Vejamos a pergunta de Roustaing e a resposta dos Espíritos:

                “Como é que, chegado ao período de preparação para entrar na humanidade, na espiritualidade consciente, o Espírito passa desse estado misto, que o separa do animal e o prepara para a vida espiritual, ao estado de Espírito formado, isto é, de individualidade inteligente, livre e responsável?”

                “É nesse momento que se prepara a transformação do instinto em inteligência consciente. Suficientemente desenvolvido no estado animal, o Espírito é, de certo modo, restituído ao todo universal, mas em condições especiais é conduzido aos mundos ad hoc, às regiões preparativas, pois que lhe cumpre achar o meio onde elaboram os princípios constitutivos do perispírito. (...) Aí perde a consciência do seu ser, porquanto a influência da matéria tem que se anular no período da estagnação, e cai num estado a que chamaremos, para que nos possais compreender, letargia. Durante esse período, o perispírito, destinado a receber o princípio espiritual, se desenvolve, se constitui ao derredor daquela centelha de verdadeira vida. Toma a princípio uma forma indistinta, depois se aperfeiçoa gradualmente como o gérmen no seio materno e passa por todas as fases do desenvolvimento. Quando o invólucro está pronto para contê-lo, o Espírito sai do torpor em que jazia e solta o seu primeiro brado de admiração. Nesse ponto, o perispírito é completamente fluídico, mesmo para nós. Tão pálida é a chama que ele encerra, a essência espiritual da vida, que os nossos sentidos, embora sutilíssimos, dificilmente a distinguem.” (1º vol., pág. 308).
               
                Respondendo a Kardec, os Espíritos ensinam que o Espírito emerge lentamente da animalidade, das necessidades materiais, através de sucessivas encarnações, ao longo de milênios sucessivos, que se constituem em oportunidades absolutamente necessárias ao seu progresso. O perispírito, que sempre reveste o Espírito, vai-se modificando com o passar do tempo.

                Roustaing se refere ao períspirito como se fosse uma roupagem preparada longe do Espírito que deva usá-la: “Quando o invólucro está pronto para contê-lo, o Espírito sai do torpor em que jazia e solta o seu primeiro brado de admiração.”
                Afirma, o Espírito que respondeu a Roustaing : “Nesse ponto, o perispírito é completamente fluídico, mesmo para nós.” Que perispírito não é fluídico? Seria apenas naquele momento?

    O Livro dos Espíritos - 609. Uma vez no período da humanidade, conserva o Espírito traços do que era precedentemente, quer dizer: do estado em que se achava no período a que se poderia chamar ante-humano?

                “Conforme a distância que medeie entre os dois períodos e o progresso realizado. Durante algumas gerações, pode ele conservar vestígios mais ou menos pronunciados do estado primitivo, porquanto nada se opera na Natureza por brusca transição. Há sempre anéis que ligam as extremidades da cadeias dos seres e dos acontecimentos. Aqueles vestígios, porém, se apagam com o desenvolvimento do livre-arbítrio. Os primeiros progressos só muito lentamente se efetuam, porque não têm a secundá-los a vontade. Vão em progressão mais rápida à medida que o Espírito adquire mais perfeita consciência de si mesmo.”

                Os Espíritos, respondendo a Roustaing, afirmam que o Espírito só volta à vida material por castigo. Se é humanizado apenas após cometer a primeira falta, depreende-se que se não houvesse falta não haveria reencarnação. Como Roustaing explicaria a evolução do Espírito? Analise-se seu diálogo com um Espírito:

                “(...) para o Espírito formado, que já tem inteligência independente, consciência de suas faculdades, consciência e liberdade dos seus atos, livre-arbítrio e que se encontra no estado de inocência e ignorância, a encarnação, primeiro, em terras primitivas, depois, nos mundos inferiores e superiores, até que haja atingido a perfeição, é uma necessidade e não um castigo?”

                “Não; a encarnação humana não é uma necessidade, é um castigo, já o dissemos. E o castigo não pode preceder a culpa.
    O Espírito não é humanizado, também já o explicamos, antes que a primeira falta o tenha sujeitado à encarnação humana. Só então ele é preparado, como igualmente já o mostramos, para lhe sofrer as consequências.” (1º vol., pág. 317)

                Em Kardec, aprende-se que  o progresso do Espírito é irreversível, o que é racional, pois se não houvesse a irreversibilidade do progresso espiritual não haveria segurança nem estabilidade no Universo.

    O Livro dos Espíritos - 118. Podem os Espíritos degenerar?
                “Não; à medida que avançam, compreendem o que os distanciava da perfeição. Concluindo uma prova, o Espírito fica com a ciência que daí lhe veio e não a esquece. Pode permanecer estacionário, mas não retrograda.”

                Roustaing admite possa um Espírito que já desempenhou funções elevadas no Mundo Espiritual ser tomado pela inveja, pelo orgulho, etc., o que evidencia uma nova versão para a “queda dos anjos”, conforme a teologia Católica Romana e, também, a Protestante.

                “Já tendo grande poder sobre as regiões inferiores, cujo governo aprenderam a exercer, no sentido de que, sempre sob as vistas dos Espíritos prepostos à missão de educá-los e sob a do protetor especial do planeta de que se trate, aprendem a dirigir a revolução das estações, a regular a fertilidade do solo, a guiar os encarnados, influenciando-os ocultamente, muitos acreditam que só ao merecimento próprio devem o que podem e, desprezando todos os conselhos, caem. É a queda pelo orgulho.
                Outros, por nem sempre compreenderem a ação poderosa de Deus, não admitem haja uma hierarquia espiritual e acusam de injustiça aquele que os criou, porquanto é Deus quem cria, não o esqueçais. Esses os que caem por inveja.
    Até o ateísmo – por mais impossível que pareça – até o ateísmo se manifesta naqueles pobres cegos colocados no centro mesmo da luz. (...) Nesse caso, sobretudo nesse caso, mais severo é o castigo. É um dos casos de primitiva encarnação humana.      Preciso se torna que os culpados sintam, no seu interesse, o peso da mão cuja existência não quiseram reconhecer.
    Qualquer que seja a causa da queda, orgulho, inveja ou ateísmo, os que caem, tornando-se, por isso, Espíritos de trevas, são precipitados nos tenebrosos lugares de encarnação humana, conforme o grau de culpabilidade, nas condições impostas pela necessidade de expiar e progredir.” (1º vol., pág. 311)

                Kardec obtém dos Espíritos Superiores resposta que deixa muito claro que o Espírito que atingiu a humanização não retorna jamais às formas animais, o que contraria frontalmente a teoria da Metempsicose esposada por Roustaing:

    O Livro dos Espíritos - 612. Poderia encarnar num animal o Espírito que animou o corpo de um homem?
    “Isso seria retrogradar e o Espírito não retrograda. O rio não remonta à sua nascente.”

                Em Roustaing, vê-se que, além de admitir a Metempsicose, afirmam seus interlocutores possa um Espírito voltar à Terra, ou a outros mundos, animando corpos primitivíssimos, como larvas!

                “Haveis dito que os Espíritos destinados a ser humanizados, por terem errado muito gravemente, são lançados em terras primitivas, virgens ainda do aparecimento do homem, do reino humano, mas preparadas e prontas para essas encarnações e que aí encarnam em substâncias humanas, às quais não se pode dar propriamente o nome de corpos, nas condições de macho e fêmea, aptos para a procriação e para a reprodução. Quais as condições dessas substâncias humanas?”

                “São corpos ainda rudimentares. O homem aporta a essas terras no estado de esboço, como tudo que se forma nas terras primitivas. O macho e a fêmea não são nem desenvolvidos, nem fortes, nem inteligentes.
                Mal se arrastando nos seus grosseiros invólucros, vivem, como os animais, do que encontram no solo e lhes convenha.
                As árvores e o terreno produzem abundantemente para a nutrição de cada espécie. Os animais carnívoros não os caçam. A providência do Senhor vela pela conservação de todos. Seus únicos instintos são os da alimentação e os da reprodução.
                Não poderíamos compará-los melhor do que a criptógamos carnudos. Poderíeis formar idéia da criação humana, estudando essas larvas informes que vegetam em certas plantas, particularmente nos lírios.” (págs. 312 / 313)

    Autenticidade da Encarnação de Jesus:
                Kardec mostra Jesus como o modelo mais perfeito para a evolução humana, logo, o seu corpo deveria ter a mesma constituição do corpo daqueles aos quais ele deveria servir de modelo, e seu testemunho basear-se na verdade.

    O Livro dos Espíritos - 625. Qual o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo?
                “Jesus.”

    O Livro dos Espíritos - 624. Qual o caráter do verdadeiro profeta?
                “O verdadeiro profeta é um homem de bem, inspirado por Deus. Podeis reconhecê-lo pelas suas palavras e pelos seus atos. Impossível é que Deus se sirva da boca do mentiroso para a ensinar a verdade.”

                Roustaing mostra um Jesus que estaria fingindo estar encarnado, desde o seu nascimento até a sua morte, que teria sido também um simulacro, uma verdadeira encenação teatral. Além do mais, ainda o chama de um Deus milagrosamente encarnado! (1º vol., págs. 242 / 243)

                “(...) um homem tal como vós quanto ao invólucro corporal e, ao mesmo tempo, quanto ao Espírito, um Deus: portanto, um homem-Deus.” (pág. 242)

                Aqui, é declarado que o invólucro corporal de Jesus era igual ao de todos nós...

                Kardec afirma categoricamente que Jesus teve um corpo carnal e um corpo fluídico, como todos encarnados temos:
                “A estada de Jesus na Terra apresenta dois períodos: o que precedeu e o que se seguiu à sua morte. No primeiro, desde a sua concepção até o nascimento, tudo se passa, pelo que respeita à sua mãe, como nas condições ordinárias da vida. Desde o seu nascimento até a sua morte, tudo, em seus atos, na sua linguagem e nas diversas circunstâncias de sua vida, revela caracteres inequívocos de corporeidade. (...) também forçoso é se conclua que, se Jesus sofreu materialmente, do que não se pode duvidar, é que ele tinha um corpo material de natureza semelhante ao de toda gente.”
                “Aos fatos materiais juntam-se fortíssimas considerações morais.
                Se as condições de Jesus, durante sua vida, fossem as dos seres fluídicos, ele não teria experimentado nem a dor, nem as necessidades do corpo. Supor que assim haja sido, é tirar-lhe o mérito da vida de privações e de sofrimentos que escolhera, como exemplo de resignação. (...) e fazer crer num sacrifício ilusório de sua vida, numa comédia indigna de um homem simplesmente honesto, indigna, portanto, e com mais forte razão de um ser tão superior. Numa palavra, ele teria abusado da boa fé dos seus contemporâneos e da posteridade. Tais as consequências lógicas desse sistema, consequências inadmissíveis, porque o rebaixariam moralmente, em vez de o elevarem.
                Jesus teve, pois, como todo homem, um corpo carnal e um corpo fluídico, o que é atestado pelos fenômenos materiais e pelos fenômenos psíquicos que lhe assinalaram a existência.” (A Gênese, cap. XV, itens 65 e 66)

                Roustaing mostra um Jesus que estaria fingindo estar encarnado, que fingia alimentar-se, desde o seu nascimento. Seria o guia e modelo enganando que mamava, que comia, que bebia, que sofria e que desencarnou?

                “Quando Maria, sendo Jesus, na aparência, pequenino, lhe dava o seio – o leite era desviado pelos Espíritos superiores que o cercavam, de um modo bem simples: em vez de ser sorvido pelo “menino”, que dele não precisava, era restituído à massa do sangue por uma ação fluídica, que se exercia sobre Maria, inconsciente dela.” (1º vol, pág. 243).
                “Os Espíritos superiores que o cercavam em número, para vós, incalculável, todos submissos à sua vontade, seus dedicados auxiliares, faziam desaparecer os alimentos que lhe eram apresentados e que não tinha para ele utilidade. Aqueles Espíritos os subtraiam da vista dos homens, de modo a lhes causar completa ilusão, à medida que parecia  ser ingeridos por Jesus, cobrindo-os, para esse fim, de fluidos que os tornavam invisíveis.” (1º vol, págs. 262/263).

    Aparição de Moisés e Elias:
                Inegavelmente, as afirmações mais claras a respeito da reencarnação, contidas no Novo Testamento, encontram-se nos Evangelhos de Mateus (17: 10-13) e de Marcos (9: 11), onde se lê que Jesus  dialogou com Moisés e Elias no Tabor, diante dos discípulos Pedro, Tiago e João. Questionado quanto à identidade de Elias, o Mestre afirma categoricamente que João Batista foi a reencarnação do Profeta Elias.
                Em Roustaing, de maneira fantasiosa e completamente inverossímil, numa tentativa de desacreditar a reencarnação, misturando fatos e fantasias, é declarado que Moisés, Elias e, consequentemente, João Batista são o mesmo Espírito, e que ali, no Monte Tabor, um outro Espírito tomou a aparência de Moisés e conversou com Jesus. Vê-se aí, mais uma vez o ilusionismo, para não dizer a falsidade da obra de Roustaing:

                “O que, porém, Jesus naquela ocasião não podia nem devia dizer e que agora tem que ser dito é o seguinte: Moisés – Elias – João Batista – são uma mesma e única entidade. Estamos incumbidos de vos revelar isso, porque chegou o tempo em que se tem de “realizar” a “nova aliança”, em que todos os homens (Judeus e Gentios) se têm que abrigar debaixo de uma só crença, da crença – em um Deus, uno, único, indivisível, Criador incriado, eterno, único eterno: o Pai; em Jesus-Cristo, vosso protetor, vosso governador, vosso mestre: o Filho; nos Espíritos do Senhor, Espíritos puros, Espíritos superiores, bons Espíritos que, sob a direção do Cristo, trabalham pelo progresso do vosso planeta e da sua humanidade: o Espírito Santo.” (2º vol., págs 497 / 498)

                A obra é volumosa, pesada, extremamente repetitiva, escrita em tom catedrático, pretensioso, que nos remete diretamente a “O Livro dos Espíritos”, item 104, no magistral estudo que o Codificador faz a respeito da “Escala Espírita”, quando se refere aos Espíritos pseudo-sábios. São Espíritos pertencentes a comunidades espirituais que teimam em manter erros doutrinários relativamente à interpretação da Mensagem Cristã, para as quais o Espiritismo representa grande perigo por esclarecer a Humanidade.

                A respeito desses Espíritos, Emmanuel faz séria advertência, que serve também como alertamento, diante dessa verdadeira “onda editorial” que está alimentando a vaidade de médiuns invigilantes e enriquecendo editoras: “As próprias esferas mais próximas da Terra, que pela força das circunstâncias se acercam mais das controvérsias dos homens que do sincero aprendizado dos espíritos estudiosos e desprendidos do orbe, refletem as opiniões contraditórias da Humanidade, a respeito do Salvador de todas as criaturas.” (“A Caminho da Luz,” cap. 12),
                Felizmente, a onda de roustainguismo está passando. Mas, como existem ainda muitos volumes dessa obra em bibliotecas e livrarias, animamo-nos a fazer estas anotações.
                                                  
                                                                                                                     




    ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
    aoofilho@oconsolador.com.br
    Londrina, Paraná (Brasil)

    O roustainguismo e seus problemas



    Sempre entendi que a discussão em torno da obra Os Quatro Evangelhos, dada a lume pelo advogado J.-B. Roustaing, devia – e ainda deve – cingir-se exclusivamente aos seus aspectos doutrinários, ou seja, primeiro é preciso conhecer a obra para depois criticar ou defendê-la. Eis o motivo pelo qual, até este momento, jamais tratei do assunto, seja aqui, seja na tribuna. 



    Alguém, porém, me pergunta que problemas há na referida obra e – caso existam – por que a editora da Federação Espírita Brasileira (FEB) a divulga e tantos nomes ilustres em nosso meio a defendem.



    Os adeptos do chamado roustainguismo formam, de fato, um contingente numeroso. Pelo menos é o que informa Luciano dos Anjos em seu livro “Os Adeptos de Roustaing”, publicado em agosto de 1993 pela Associação Espírita Estudantes da Verdade, de Volta Redonda (RJ).



    Respondendo à indagação inicial, digo que é fácil perceber na obra de Roustaing a existência de quatro pontos que a tornam incompatível com a Doutrina Espírita exposta nas obras de Kardec, Delanne, André Luiz e Emmanuel. Claro que, excetuados esses problemas, apresenta ela coisas atraentes, especialmente no que se refere à apresentação primorosa que a FEB lhe deu, um cuidado que jamais a editora teve com quaisquer outras obras. 

    Os quatro pontos a que me refiro são estes:

    I. A tese de que a encarnação não é obrigatória, nem mesmo necessária, e só se dá em caso de queda do Espírito. A evolução da criatura humana, após a passagem do princípio inteligente pelos reinos inferiores da criação, ocorreria, segundo Roustaing, em cidades espirituais nas quais o Espírito reveste tão-somente um corpo fluídico – o perispírito. Se o indivíduo apresentar nessa condição algum defeito a ser corrigido (vaidade, inveja etc.), aí sim, por castigo, terá de encarnar. A reencarnação seria uma conseqüência dessa primeira encarnação. O assunto é tratado no volume 1, pp. 317 e 321, no volume 3, p. 91, e no volume 4, p. 292, da 8a edição, de agosto de 1994, publicada pela FEB.

    II. Ao ter de encarnar, o Espírito fá-lo-á em um mundo primitivo, encarnando-se aí num corpo rudimentar que viverá, como os animais, do que encontrar no solo. “Não poderíamos compará-los melhor do que a criptógamos carnudos”, diz o livro em seu volume 1, p. 313. Um exemplo conhecido de criptógamo carnudo são as nossas lesmas. O livro de Roustaing está dizendo, portanto, que uma alma humana, depois de viver numa cidade espiritual, encarnará numa forma animal que nem mesmo chegou ao nível dos vertebrados, um ensinamento que reedita a doutrina da metempsicose, rejeitada formalmente pela Doutrina Espírita. O assunto é tratado ainda nas pp. 299 e 312 do volume citado.

    III. A encarnação, que normalmente não é necessária, só se dá em caso de queda do Espírito, uma alusão à retrogradação da alma, que o Espiritismo não admite. Os motivos, diz a obra, são diversos e seus resultados, terríveis. “Qualquer que seja a causa da queda, orgulho, inveja ou ateísmo, os que caem, tornando-se por isso Espíritos de trevas, são precipitados nos tenebrosos lugares da encarnação humana, conforme ao grau de culpabilidade, nas condições impostas pela necessidade de expiar e progredir”, eis a lição transmitida na obra em seu volume 1, p. 311. 

    IV. Afirma Roustaing que Jesus não encarnou para vir à Terra trazer-nos a Boa Nova. Seu corpo teria sido fluídico. Ele fora, assim, um agênere, um Espírito materializado e desse modo se explicariam seu desaparecimento dos 12 aos 30 anos, período do qual ninguém fala, e o sumiço do corpo material nos dias seguintes à crucificação. O assunto é tratado nos quatro volumes da obra, constituindo um dos aspectos mais conhecidos da doutrina roustainguista e, por isso mesmo, o mais criticado.

    Allan Kardec examinou em suas obras os quatro assuntos acima focalizados: a encarnação do Espírito como requisito indispensável à evolução espiritual e ao progresso dos planetas; a metempsicose, que rejeitou expressamente; o princípio da não-retrogradação da alma e a natureza corpórea do corpo de Jesus, ao qual dedicou os itens 64 a 67 do cap. XV de seu livro “A Gênese”. 



    A conclusão que podemos tirar, à vista do exposto, é uma só: os espíritas que apóiam a obra de Roustaing certamente não a leram; pelo menos é o que deve ter ocorrido com escritores importantes que a elogiaram em certa época e depois mudaram de idéia, como os saudosos confrades Carlos Imbassahy e Henrique Rodrigues.





    LEONARDO MARMO MOREIRA
    leomarmo@iqsc.usp.br
    De São Carlos, SP

    Os erros metodológicos
    de Roustaing
    O benfeitor espiritual Erasto afirma em "O Livro dos Médiuns" que "É preferível rejeitar dez verdades a aceitar uma única mentira". Tal assertiva denota prudência e critério para a avaliação de qualquer conteúdo, mais notadamente os que são de origem mediúnica.
    A discussão em torno dos pontos controvertidos da obra de Roustaing nos remete não só à avaliação da diferença de conteúdo doutrinário em relação à obra de Kardec mas igualmente à análise da metodologia empregada para a obtenção das mensagens mediúnicas que os dois autores utilizaram na compilação dos seus respectivos textos, pois, obviamente, os dois tópicos supracitados estão intrinsecamente relacionados.
    A partir da leitura do prefácio de "Os Quatro Evangelhos" (foto) é possível constatar os seguintes pontos:

    1) Roustaing superestimou a credibilidade dos textos bíblicos.
    À semelhança de católicos e protestantes, Roustaing considerou a Bíblia "a palavra de Deus" e tentou explicar absolutamente tudo, sem se dar conta de que muito do que está escrito pode não ter acontecido exatamente da maneira como está narrado nos textos bíblicos. Roustaing consciente ou inconscientemente elaborou uma espécie de Reforma, semelhante à Reforma protestante. Assim, a partir da superestimação da Bíblia, a sua fusão desta com os seus limitados conhecimentos espíritas seria uma temeridade.

    Reparem que, ao contrário da codificação kardequiana que nasce como ciência, a proposta roustainguista já nasce como religião, pois se trata de uma nova interpretação da Bíblia a partir da velha tese da infalibilidade dos seus textos. Tanto isso é verdade que a própria estruturação da obra "Os Quatro Evangelhos" é baseada nessa submissão aos textos bíblicos. Se a obra em questão foi realmente orientada pelos quatro evangelistas, assistidos pelos apóstolos, que foram as principais e mais preparadas testemunhas oculares dos fatos evangélicos, por que os apóstolos não contaram o que de fato aconteceu diretamente, ao invés de se basearem literalmente no que sobreviveu de registro na Bíblia e que, obviamente, sofreu com quase dois milênios de interpolações, adulterações, traduções grosseiras e outros problemas?!

    Kardec, ao contrário, parte da análise do fenômeno mediúnico em um estudo criterioso sem nenhuma idéia preconcebida e, em princípio, não utilizando de maneira nenhuma a Bíblia como referencial. Aplicando o método experimental, através de análise qualitativo-quantitativa, por meio de vários médiuns previamente selecionados, busca a chamada "universalidade do ensino dos Espíritos", submetendo todos os autores espirituais ao mais crítico interrogatório e aplicando a mais rigorosa lógica na avaliação do conteúdo das mensagens.
    Portanto, a codificação nasce como ciência, para gerar um corpo filosófico como conseqüência da verdade irrefutável da imortalidade da alma e da comunicabilidade dos Espíritos. E, finalmente, a filosofia espírita repercute nas inevitáveis conseqüências morais, que constituem o aspecto religioso do Espiritismo. Kardec jamais superestimou os textos evangélicos, o que é explícito tanto em "O Evangelho segundo o Espiritismo" como em "A Gênese". É por essa necessidade de nascimento como ciência e, subseqüentemente, como filosofia antes de se aprofundar o seu aspecto religioso, nesse maravilhoso tríplice aspecto, que o primeiro e principal livro espírita é a obra "O Livro dos Espíritos" e o segundo livro publicado, considerado por Kardec como a continuação do primeiro, é "O Livro dos Médiuns". De fato, ao aplicar os princípios espíritas na elucidação dos pontos principais do Evangelho, toda a estrutura doutrinária já estava extremamente sólida, independentemente das inumeráveis controvérsias geradas pelas diferentes interpretações bíblicas. Portanto, o Espiritismo não é uma reforma, como a reforma Luterana, porque não nasce como uma releitura da Bíblia, mas como ciência através do estudo da mediunidade.

    2) Roustaing "decidiu" que era necessária uma nova revelação.

    A partir da excessiva valorização dos textos evangélicos, Roustaing diz "...senti a impotência da razão humana para penetrar as trevas da letra e, desde então, a necessidade de uma revelação nova, de uma revelação da revelação". Note que, a partir de uma premissa equivocada, o próprio Roustaing decidiu que era necessária uma nova revelação, porque, segundo ele mesmo explica no prefácio de sua obra, a codificação explicava muito bem os aspectos morais e doutrinários da Bíblia, mas, em sua opinião, não explicava a figura de Jesus. Ora, decidir sobre a necessidade de uma nova revelação não era tarefa para ele, e nem para nenhum de nós, mas sim trabalho da Providência Divina. Roustaing poderia elaborar o seu trabalho mas daí a defini-lo, aprioristicamente, como a "revelação da revelação" foi um exagero. De fato, essa expressão "revelação da revelação" é repetida exaustivamente tanto no prefácio como na introdução e é quase sempre acompanhada pela expressão "revelação nova", em um esforço evidente para situar a obra realmente como uma revelação divina. Com efeito, na folha de rosto de "Os Quatro Evangelhos" Roustaing define sua obra como sendo "Revelação da Revelação" ou "Espiritismo Cristão", o que poderia sugerir que "há vários tipos de espiritismo" ou, até mesmo, que a Codificação não seria uma obra cristã. Se Roustaing pretendia que sua obra fosse considerada espírita, tendo mesmo enviado uma cópia para a análise de Kardec, conforme registrado na Revista Espírita, essa definição poderia ser considerada uma invigilância do advogado de Bordeaux.

    A título de ilustração vale lembrar que da primeira revelação, personificada em Moisés, até a segunda, personificada em Jesus, foram aproximadamente 2 milênios e de Jesus até a codificação mais 18 séculos. Desta forma, seria muito estranho uma suposta quarta revelação começar a ser elaborada concomitantemente com a terceira revelação, já que a codificação do Espiritismo só seria concluída em 1868 com a publicação de "A Gênese", bem depois, portanto, do trabalho de Roustaing, que iniciou a confecção de sua obra em 1861 para publicá-la em 1866. Na mensagem intitulada "Meu Sucessor", em "Obras Póstumas", Kardec indaga sobre o continuador da obra, em função de já se apresentar com a saúde comprometida, e os Espíritos respondem que não era o momento de que o sucessor aparecesse, pois era necessário que a Codificação ficasse acentuadamente centralizada nas mãos dele, Kardec, para que a obra básica tivesse alta homogeneidade. Segundo o professor J. Herculano Pires, o sucessor em questão se trata de Léon Denis, que ainda era muito moço nessa época. Portanto, nenhuma menção a Roustaing ou a qualquer outro trabalho concomitante à codificação, o que é bastante sugestivo para uma obra que se intitula a "revelação da revelação".


    3) A Igreja Católica nas análises das obras de Roustaing e Kardec.

    No terceiro tomo da obra "Os Quatro Evangelhos" (p.65) os autores ensinam que o futuro espiritual da humanidade estará focalizado na Igreja Católica e no Papa. Eles afirmam o seguinte: "O chefe da Igreja católica, nessa época em que este qualificativo terá a sua verdadeira significação, pois que ela estará em via de tornar-se universal, como sendo a Igreja do Cristo, o chefe da Igreja católica, dizemos, será um dos principais pilares do edifício. Quando o virdes, cheio de humildade, cingido de uma corda e trazendo na mão o cajado do viajante...".

    Esse comentário estranhíssimo, para dizer o mínimo, entra claramente em choque com a opinião dos Espíritos que orientavam Allan Kardec.

    Para citar apenas uma única fonte, basta ler as mensagens registradas em "Obras Póstumas" intituladas "Futuro do Espiritismo" e "A Igreja". Na primeira o autor espiritual assevera "...cabe-nos retificar os erros da história e apurar a religião do Cristo, transformada, nas mãos dos padres, em comércio e em vil tráfico. Instituirá (o Espiritismo) a verdadeira religião, a religião natural, a que parte do coração e vai diretamente a Deus, sem dependência das obras da sotaina ou dos degraus do altar".

    Na segunda mensagem citada é comentado que "Chegou a hora em que a Igreja deve prestar contas do depósito que lhe foi confiado; do modo como praticou os ensinos do Cristo, do uso que fez da sua autoridade, da incredulidade, enfim, a que arrastou os homens". E mais à frente o autor é ainda mais incisivo quanto ao futuro da Igreja estabelecendo que "Deus a julgou e reconheceu-a imprópria, de hoje em diante, para a missão do progresso, que incumbe a toda autoridade espiritual". Ainda sobre a Igreja Católica e o futuro da humanidade o Espírito d´ E... afirma que a Igreja "acha-se nesta alternativa: ou se transforma e suicida-se, ou fica estacionária e sucumbe esmagada pelo carro do progresso". Como se não bastasse, o autor ainda é mais peremptório asseverando que "a doutrina espírita é chamada a ferir de morte o papado..." e conclui seu artigo com a seguinte frase "A Igreja atira-se, por si mesma, ao precipício".

    Essa gigantesca incoerência faz-nos questionar o motivo que levaria o mundo espiritual superior a enviar à Crosta uma terceira e uma quarta revelações se o futuro espiritual da Terra seria guiado pela representante do seu passado, que é a Igreja, com a sua trajetória dominadora, ritualística, inquisidora e obscurantista.
    Para que Espiritismo como terceira revelação se a Doutrina Espírita discrepa profundamente da Igreja Católica em inumeráveis pontos?

    Por outro lado, as perguntas mais simples e objetivas que surgem são as seguintes: Espíritos de mesma intenção e evolução (supostamente evolvidos intelecto e moralmente) poderiam ensinar conceitos tão discordantes um do outro?! E Roustaing não teria avaliado criticamente o conteúdo da mensagem e suspeitado dessa informação?!

    4) Ao contrário de Kardec, Roustaing utiliza uma única médium.

    Roustaing se isolou com a médium Émilie Collignon, evitando o intercâmbio com trabalhadores mais experientes que poderiam elaborar críticas aos textos e indagações mais exigentes e contundentes aos Espíritos orientadores da obra. Roustaing afirma "Mero instrumento, cumpri um dever executando tal ordem, entregando à publicidade esta obra...". Roustaing se mostra muito submisso e passivo em relação aos Espíritos que orientam a obra, o que pode ser facilmente constatado em várias passagens do prefácio da sua obra. Aparentemente, Roustaing não eliminou nenhum texto, o que explicaria a grande extensão de sua obra de mais de 2.000 páginas em um prazo relativamente curto para um trabalho efetuado com uma única médium. Essa atitude é bem diferente da postura altamente crítica do Codificador. Vale lembrar que médiuns psicógrafos de conhecida credibilidade como Chico Xavier, Divaldo Franco e Raul Teixeira afirmam que "queimaram malas de mensagens" no início de suas tarefas, pois eram apenas exercícios mediúnicos, sem qualidade suficiente para publicar. O próprio Allan Kardec, registra mensagens que ele considerou não condizentes com as assinaturas, mostrando que até mesmo ele estava sujeito às chamadas mistificações. O ponto-chave é que ele identificou essas mensagens como oriundas de Espíritos mistificadores e ainda as aproveitou como recurso didático.

    5) Roustaing não avaliou a potencialidade mediúnica e o conteúdo moral de Mme. Collignon.

    Roustaing assevera no prefácio de sua obra: "O trabalho ia ser feito por dois entes que, oito dias atrás, não se conheciam". Está evidente que Roustaing não avaliou o nível moral de Émilie Collignon e nem sua capacidade mediúnica, pois não a conhecia e em um intervalo de 8 dias começou a obra sem um maior planejamento ou avaliação da viabilidade e dos perigos da empreitada. O critério da avaliação moral do médium é fundamental pois pela sintonia o médium convive predominantemente com os Espíritos que correspondem à sua elevação espiritual. Emmanuel, em sua obra "Roteiro", é categórico, estabelecendo que "não existe bom médium sem homem bom". Todo dirigente de reuniões mediúnicas conhece minimamente a complexidade do fenômeno mediúnico e os riscos que procedimento semelhante à atitude de Roustaing pode acarretar.

    6) Roustaing evocou somente Apóstolos e o Precursor João Batista.

    A assertiva conhecida no meio espírita de que "o telefone toca de lá para cá" não foi respeitada por Roustaing. Vale consultar a contundente desaprovação do procedimento de evocação nominal direta, enunciada pelo benfeitor Emmanuel na Questão 369 da obra "O Consolador". Realmente, há riscos óbvios de Espíritos embusteiros usarem nomes de grandes Espíritos para se fazerem mais respeitáveis e aceitos. Por outro lado, quanto mais evoluído é o Espírito, maior número de grandes responsabilidades ele tem no mundo espiritual, que acabam limitando sua capacidade de atender pessoalmente a todas as evocações, principalmente aquelas oriundas de pessoas pouco moralizadas e responsáveis.

    7) São João Evangelista seria co-autor tanto da obra de Kardec como da obra de Roustaing?!

    São João Evangelista é co-autor da codificação, sendo citado até mesmo nos Prolegômenos de "O Livro dos Espíritos". Entretanto, supostamente, ele também seria co-autor da obra "Os Quatro Evangelhos" tanto pela sua condição de Evangelista como também pela sua condição de Apóstolo, tendo sido, inclusive, um dos mais participativos e próximos a Jesus em todo o Evangelho. Assim sendo, como é que as obras em questão teriam pontos tão divergentes como, por exemplo, a questão da reencarnação, que para a Codificação é necessidade e para "Os Quatro Evangelhos" é castigo e o problema da metempsicose, rejeitada peremptoriamente pela Codificação e admitida pela obra de Roustaing? Essa questão da identidade dos autores merece ser analisada com cuidado pois as obras em questão não tratam de opiniões pessoais de Espíritos mas de Leis Universais e, ademais, sendo os autores, em princípio, da mais elevada evolução, eles não poderiam divergir tão intensamente em pontos capitais dos ensinos. São João Evangelista não poderia ensinar algo em um lugar e outra coisa em outro, a não ser que em um desses lugares não fosse ele, mas alguém que se fizesse passar por ele, utilizando seu nome, algo bem comum em mediunidade, quando os cuidados fundamentais para a prática segura de tal intercâmbio não são considerados. Admitindo-se tal possibilidade, a credibilidade das informações contidas na obra em questão estaria comprometida.

    Em suma, Roustaing demonstrou desconhecer as problemáticas da mediunidade, o que é facilmente explicável haja vista a pressa que ele demonstrou no estudo prévio das obras de Allan Kardec. O próprio Roustaing afirma no prefácio de "Os Quatro Evangelhos" que leu "O Livro dos Espíritos", "O Livro dos Médiuns" e um número enorme de obras sobre questões correlatas ao Espiritismo a partir de janeiro de 1861, o mesmo ano que ele começou a elaboração de "Os Quatro Evangelhos". Antes disso, ele nem sabia que é possível a comunicação com os Espíritos. Certamente, essas leituras foram superficiais, tendo-se em vista a profundidade do conteúdo das mesmas e o número de obras lidas em um intervalo de tempo reduzidíssimo. Ademais, ler é uma coisa, ao passo que estudar e assimilar é outra completamente diferente, principalmente em se tratando de um assunto com tamanhas nuanças e problemas como é a mediunidade.

    Desta forma, entende-se por que Allan Kardec considerou a obra "Os Quatro Evangelhos" apenas como opinião pessoal dos seus autores espirituais não podendo ser considerada como parte integrante da Doutrina Espírita, conforme exarado na Revista Espírita. Afinal, a priori, "é preferível rejeitar dez verdades a aceitar uma única mentira". "Na dúvida, abstém-te", nos ensina "O Evangelho segundo Espiritismo" e a obra de Roustaing apresenta várias dúvidas, incoerências e especulações sem comprovações científicas que não estão em coerência com o pensamento kardequiano.




    Jorge Hessen
    jorgehessen@gmail.com
    Brasília -DF

    ROUSTAING – O SESQUICENTENÁRIO TÃO AGUARDADO NA FEB

    Um confrade muito querido sugeriu-me escrever sobre a revista Reformador, estabelecendo um paralelo entre a elevação dos conteúdos doutrinários veiculados no passado remoto , e a atual insipidez doutrinária e excesso de fotografias de dirigentes publicadas nas suas páginas.

    Outro companheiro informou-me que a FEB – Federação Espírita Brasileira está preparando o lançamento (previsto para o mês de junho de 2016) da nova edição dos “Quatro Evangelhos”, almejando a submissão comemorativa aos 150 anos de lançamento do livro de J.B. Roustaing. Em face disso, telefonei  para o departamento editorial da FEB e fui  informado sobre o tal lançamento, em razão disso, deliberei antecipar um manifesto de alerta em face da augurada reedição das obras que representam a ruptura de união ente os espíritas no Brasil.

    Percorrendo determinadas narrativas sobre a história da revista Reformador inteiramo-nos de que ela foi fundada em 21/1/1883 por Augusto Elias da Silva, um fotógrafo português, num corajoso empreendimento de difusão espírita no Brasil do século XIX. Isto porque, fundar e conservar um órgão de propaganda espírita, na Corte do Brasil era, naquele período, para esmorecer o ânimo dos espíritas mais resolutos. Uma vez que dos púlpitos brasileiros, principalmente dos da Capital, choviam anátemas sobre os espíritas, os novos hereges que cumpria abater.

    Escreveu o fotógrafo lusitano o seguinte: “Abre caminho, saudando os homens do presente que também o foram do passado e ainda hão de ser os do futuro, mais um batalhador da paz: o “Reformador”. Com essas palavras inaugurais apresentava-se, no Brasil o novo órgão da divulgação espírita. ”[1]

    O artigo de fundo do primeiro número traçava as diretrizes de paz e progresso pelos quais se nortearia o informativo, definindo ainda os objetivos que tinha em vista alcançar. Apresentou-se, portanto, o “Reformador” como mais um semeador da paz, apetrechado da tolerância e da fraternidade, desfraldando a bandeira da presumível “união” entre os espíritas. Ótimo!

    Até 1888 a redação do periódico funcionou (no ateliê) montado na residência do Elias da Silva. Era um jornal quinzenal composto de quatro páginas e estima-se que sua tiragem inicial era de aproximadamente 300 exemplares, contando com cerca de uma centena de assinantes. A partir de 1902 passou ao formato de revista, inicialmente com 20 páginas e periodicidade bimestral. Na década de 1930 passou a ser mensal, e o número de páginas aumentou gradativamente. Em 1939, a FEB adquiriu e instalou as máquinas impressoras próprias, nas dependências dos fundos do prédio da Avenida Passos. Foi uma decisiva empreitada e graças a essa providência, as edições e reedições de livros espíritas e da revista começaram sua expansão.

    Em seguida, com a instalação do complexo gráfico, em 1948, em amplo edifício (atualmente abandonado, arrasado e falido) especialmente construído em São Cristóvão/Rio de Janeiro, a FEB acresceu a propaganda doutrinária. Paradoxalmente, na década de 1970 a FEB “modernizou” as impressões de Reformador com as capas coloridas, substituindo inclusive o logotipo e desenho, mas a Revista tomou novo rumo gráfico oferecendo gigantescos espaços de proeminência para as imodestas imagens (fotos) dos diretores febianos.

    Apesar de ser um dos quatro periódicos surgidos no Rio de Janeiro, de 1808 a 1889, que sobreviveram até os dias atuais e o único que nunca teve interrompida sua publicação, todavia diversas vezes desviou-se do programa de estudar, difundir e propagar a legítima Doutrina dos Espíritos sob o seu tríplice aspecto (científico-filosófico-religioso), sobretudo durante a coordenação do editor Luciano dos Anjos.
    Em verdade, tudo tem matrizes nos eternos diretores roustanguistas que ininterruptamente (há mais de 100 anos) se revezam na direção da FEB até os dias atuais. Nesse confuso cenário foram infligidos e cedidos espaços fadigosos do periódico a fim de veicular as burlescas teses da metempsicose consubstanciada nos “criptógamos carnudos” (involução), do neo-docetismo [2] consoante propostos nas obras do visionário J.B. Roustaing, um “após(tolo)” da discórdia! E pelo que sei, desde a primeira edição já são mais de 15 milhões de exemplares publicados pela FEB.

    A trajetória centenária do Reformador se confunde com a própria história do quartel-general de J.B.Roustaing, a FEB,  da qual tem sido a porta-voz e a representação do seu pensamento. Confrades que não rezam pela cartilha roustanguista, embora sejam coordenadores de uma ou outra área doutrinária da FEB (baixo clero), jamais alcançaram lograr maiores destaques administrativos, sendo “aceitos” de esguelha pelos poderosos diretores (alto clero) , todos fanáticos pelo advogado de Bordeaux.

    A revista Reformador, não raro, expressou várias vezes uma linha editorial e diretrizes a serviço do Evangelho à maneira sorrateira dos fastidiosos volumes dos “Quatro Evangelhos” de Roustaing, tal como ocorreu na presidência do Armando de Assis. Destaque-se que os quatro volumes de Roustaing são estudados sistematicamente nas reuniões públicas realizadas todas as terças feiras na sede da FEB, em Brasília e na sucursal febiana, sediada na Av. Passos-Rio de Janeiro, e isto diz tudo.

    A FEB e UNICAMENTE ELA sucessivamente esteve na dianteira  em defesa do roustanguismo. Nessa linha de contra-senso, tem expressado sempre a prevalência das suas verdades docetistas, embaralhadas e camuflada atrás da boa literatura do Chico Xavier e dos clássicos que edita. A  FEB acredita  que conseguirá catalisar a “unificação” e a unidade da Doutrina; mas em realidade , sempre sucederam e sobrevirão as dissidências (internas e externas) resultantes dos sofismas de princípios insustentáveis pela racionalidade kardeciana.

    Para a consubstanciação do projeto da disseminação do docetismo, há mais de um século a FEB vem catequisando à socapa alguns confrades ingênuos. Na volúpia insuperável das interpretações equivocadas dos eternos fascinados pelos “Quatro evangelhos” vai transformando o caleidoscópico Movimento Espírita Brasileiro numa desordem ideológica sem precedentes inspirados nos vaporosos pilares dos engodos dos Quatro Evangelhos.

    Com Roustaing narcotizando a mente do alto clero febiano será empreita impraticável evitar a dispersão sistemática e generalizada cada vez mais acentuada dos espíritas, em caminho de desintegração, por força de interferências obsessivas em nível de fascinação. Se a unidade doutrinária foi a única e derradeira divisa de Allan Kardec para o fortalecimento do Espiritismo, a união deve ser a fortaleza inexpugnável da Doutrina Espírita. Em verdade a FEB não conseguiu avançar coisa nenhuma nesse quesito de união entre os espíritas, justamente por que se deixou abater diante dos embustes docetistas, e de outras aberrações doutrinárias contidas na obra do bordelense, razão suficiente para não lograr a unificação,  pois desconhece o poderoso antídoto contra os venenos das discórdias e desuniões, a coerência legada pelas obras codificadas por Allan Kardec.

    Herculano Pires na sua sapiência ponderava: “Em os Quatro Evangelhos as verdades são sempre contrariadas pelas mentiras, o natural é prejudicado pelo absurdo e o belo é sempre desfigurado pelo horrível. Jesus é fluidificado, purificado e até endeusado; mas também é ironizado, ridicularizado, deturpado e estupidificado”! “Roustaing é o anti-Kardec. Se Kardec é o bom senso, Roustaing é a falta de bom senso”. [3]

    Queira Deus que no futuro não distante ressurja o ideário da concepção e fundação de uma CONFEDERAÇÃO ESPÍRITA no Brasil (sem Roustaing, óbvio!)

    Jorge |Hessen
    Referências:
    [1]            disponível em http://febnet.org.br/site/conheca.php?SecPad=3&Sec=188  acesso em 13/04/2016
    [2]            Os gnósticos-docetas do primeiro século sustentavam que Jesus não tinha realidade física, que o seu corpo era apenas aparente. Sua posição contrariava as teses da encarnação do Cristo, apresentando-o como uma espécie de Deus mitológico, sob a influência das idéias helenísticas. O Docetismo exerceu grande influência em Alexandria, propagando-se a Éfeso, onde o apóstolo João instalara a sua Escola Cristã. João refutou a tese doceta como herética, pois além de não corresponder à realidade histórica, transformava o Cristo num falsário.  A fábula dos docetas ( como o apóstolo Paulo a classificou) apresentava-se como uma das mais estranhas desfigurações do Cristo, fornecendo elementos ricos e valiosos aos mitólogos para negarem a existência real e histórica de Jesus de Nazaré.
    [3]            Pires, Herculano. O Verbo e a Carne, São Paulo: Ed Paideia,



    Paulo da Silva Neto Sobrinho 




    Os quatro Evangelhos de Roustaing

    Recentemente acabamos de ler o livro Êxodo, ditado pelo Espírito Cecília, através da médium Irene Pacheco Machado, que trata especificamente do livro Êxodo constante da Bíblia.
    Nele encontramos a afirmação da autora espiritual de que Moisés foi posteriormente as personalidades Elias e João Batista. Até então, não tínhamos nenhuma informação sobre isso e nem nos estudos que fizemos, desde 1987, quando ingressamos no Movimento Espírita, nos lembramos de ter lido algo parecido. Assim, no interesse de conhecer a verdade, pedimos explicações ao Editor, que, muito gentilmente, nos respondeu:
    “C om relação ao fato de Moisés e E lias terem aparecido no episódio da transfiguração, apesar de serem o mesmo E spírito, transcreveremos trecho da obra Os Quatro E vangelhos, editada pela Federação E spírita Brasileira, C asaMáter do E spiritismo em nosso País, merecedora, portanto, de todo crédito”:
    “Moisés, E lias e J oão sempre foram o mesmo E spírito reencarnado, mas não a mesma personalidade humana, a mesma individualidade terrena. Assim é que, no Tabor, quando da transfiguração de J esus, um E spírito superior, da mesma elevação que E lias e J oão, tomou a figura, a aparência de Moisés. Tais substituições se dão quando necessárias — por E spíritos da mesma ordem”. (Volume 2, pág. 498).
    A esse respeito, esclarece Kardec:
    “À medida que os E spíritos se purificam e elevam na hierarquia, os caracteres distintivos de suas personalidades se apagam, de certo modo, na uniformidade da perfeição; nem por isso, entretanto, conservam eles menos suas individualidades. É o que se dá com os E spíritos superiores e os E spíritos puros. Nessa culminância, o nome que tiveram na Terra, em uma das mil existências corporais efêmeras por que passaram, é coisa absolutamente insignificante. (… )
    O mesmo ocorre todas as vezes que um E spírito superior se comunica espontaneamente, sob o nome de uma personagem conhecida. Nada prova que seja exatamente o E spírito dessa personagem; porém, se ele nada diz que desminta o caráter desta última, há presunção de ser o próprio e, em todos os casos, se pode dizer que, se não é ele, é um E spírito do mesmo grau de elevação, ou talvez até um enviado seu.(… ).
    A questão da identidade é, pois, como dissemos, quase indiferente, quando se trata de instruções gerais, uma vez que os melhores E spíritos podem substituir-se mutuamente, sem maiores consequências.” (O Livro dos Médiuns, item 256).
    Tudo leva a crer que o Editor está coberto de razão que, por sinal, fez pertinentes colocações baseadas em O Livro dos Médiuns, sobre a hipótese do espírito Elias, na ocasião da transfiguração, ter sido substituído por outro Espírito que assumiu, vamos dizer assim, a aparência dele. Deixaremos para um pouco mais à frente a análise desse ponto.
    Parecia que a questão estava resolvida, mas alguma coisa nos dizia que deveríamos ver a opinião de Kardec sobre a obra do advogado Jean-Baptiste Roustaing. Pelo que deduzimos, Kardec teve muito mais bom senso do que a FEB – Federação Espírita Brasileira, já que não aprovou e nem desaprovou (sem isso querer dizer que ele tenha ficado em cima do muro) Os Quatro Evangelhos, sugerindo que tudo fosse passado pelo Controle Universal do Ensino dos Espíritos, coisa que, obviamente, somente no futuro poderia ocorrer.
    Em janeiro de 1868, data posterior ao lançamento da obra em questão, o
    Codificador lança o livro A Gênese, no qual podemos ver que, num certo ponto, Kardec defende, sem nenhuma sombra de dúvida, que Jesus teve um corpo físico comum a todos nós, habitantes do planeta Terra.
    Em A Gênese, no capítulo XV, “Os milagres do Evangelho”, encontramos, no item 2, o seguinte parágrafo:
    C omo homem, tinha a organização dos seres carnais; porém, como
    E spírito puro, desprendido da matéria, havia de viver mais da vida espiritual, do que da vida corporal, de cujas fraquezas não era passível. A sua superioridade com relação aos homens não derivava das qualidades particulares do seu corpo, mas das do seu E spírito, que dominava de modo absoluto a matéria e da do seu perispírito, tirado da parte mais quintessenciada dos fluidos terrestres (cap. XIV, nº 9). S ua alma, provavelmente, não se achava presa ao corpo, senão pelos laços estritamente indispensáveis. C onstantemente desprendida, ela decerto lhe dava dupla vista, não só permanente, como de excepcional penetração e superior de muito à que de ordinário possuem os homens comuns. [… ]. (KAR DE C , 2007e, p. 354-355, grifo nosso).
    Veja bem, caro leitor, que, já de início, Kardec não usa de meias palavras para expor seu pensamento de que Jesus, “como homem, tinha a organização dos seres carnais”. Ora, a tese levantada por Roustaing é a de que Jesus possuía, não um corpo carnal, mas um corpo fluídico, o que é, inevitavelmente, contrário àquilo que disse o Codificador do Espiritismo.
    Mais à frente, quando Kardec fala sobre o desaparecimento do corpo de Jesus, ele detalha melhor seu pensamento que, para nós, teve um destinatário certo, qual seja, a obra de Roustaing, especialmente a partir do segundo parágrafo do item 64:
    64. O desaparecimento do corpo de J esus após sua morte há sido objeto de inúmeros comentários. Atestam-no os quatro evangelistas, baseados nas narrativas das mulheres que foram ao sepulcro no terceiro dia depois da crucificação e lá não o encontraram. Viram alguns, nesse desaparecimento, um fato milagroso, atribuindo-o outros a uma subtração clandestina.
    S egundo outra opinião, J esus não teria tido um corpo carnal, mas apenas um corpo fluídico; não teria sido, em toda a sua vida, mais do que uma aparição tangível; numa palavra: uma espécie de agênere. S eu nascimento, sua morte e todos os atos materiais de sua vida teriam sido apenas aparentes. Assim foi que, dizem, seu corpo, voltado ao estado fluídico, pode desaparecer do sepulcro e com esse mesmo corpo é que ele se teria mostrado depois de sua morte.
    É fora de dúvida que semelhante fato não se pode considerar radicalmente impossível, dentro do que hoje se sabe acerca das propriedades dos fluidos; mas, seria, pelo menos, inteiramente excepcional e em formal oposição ao caráter dos agêneres. (C ap. XIV, nº 36.) Trata-se, pois, de saber se tal hipótese é admissível, se os fatos a confirmam ou contradizem.
    65. A estada de J esus na Terra apresenta dois períodos: o que precedeu e o que se seguiu à sua morte. No primeiro, desde o momento da concepção até o nascimento, tudo se passa, pelo que respeita à sua mãe, como nas condições ordinárias da vida (1). Desde o seu nascimento até a sua morte, tudo, em seus atos, na sua linguagem e nas diversas circunstâncias da sua vida, revela os caracteres inequívocos da corporeidade. S ão acidentais os fenômenos de ordem psíquica que nele se produzem e nada têm de anômalos, pois que se explicam pelas propriedades do perispírito e se dão, em graus diferentes, noutros indivíduos. Depois de sua morte, ao contrário, tudo nele revela o ser fluídico. É tão marcada a diferença entre os dois estados, que não podem ser assimilados.
    O corpo carnal tem as propriedades inerentes à matéria propriamente dita, propriedades que diferem essencialmente das dos fluidos etéreos; naquela, a desorganização se opera pela ruptura da coesão molecular. Ao penetrar no corpo material, um instrumento cortante lhe divide os tecidos; se os órgãos essenciais à vida são atacados, cessa-lhes o funcionamento e sobrevém a morte, isto é, a do corpo. Não existindo nos corpos fluídicos essa coesão, a vida aí já não repousa no jogo de órgãos especiais e não se podem produzir desordens análogas àquelas. Um instrumento cortante ou outro qualquer penetra num corpo fluídico como se penetrasse numa massa de vapor, sem lhe ocasionar qualquer lesão. Tal a razão por que não podem morrer os corpos dessa espécie e por que os seres fluídicos, designados pelo nome de agêneres, não podem ser mortos.
    Após o suplício de J esus, seu corpo se conservou inerte e sem vida; foi sepultado como o são de ordinário os corpos e todos o puderam ver e tocar. Após a sua ressurreição, quando quis deixar a Terra, não morreu de novo; seu corpo se elevou, desvaneceu e desapareceu, sem deixar qualquer vestígio, prova evidente de que aquele corpo era de natureza diversa da do que pereceu na cruz; donde forçoso é concluir que, se foi possível que J esus morresse, é que carnal era o seu corpo.
    Por virtude das suas propriedades materiais, o corpo carnal é a sede das sensações e das dores físicas, que repercutem no centro sensitivo ou E spírito. Quem sofre não é o corpo, é o E spírito recebendo o contragolpe das lesões ou alterações dos tecidos orgânicos. Num corpo sem E spírito, absolutamente nula é a sensação. Pela mesma razão, o E spírito, sem corpo material, não pode experimentar os sofrimentos, visto que estes resultam da alteração da matéria, donde também forçoso é se conclua que, se J esus sofreu materialmente, do que não se pode duvidar, é que ele tinha um corpo material de natureza semelhante ao de toda gente.
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    (1) Não falamos do mistério da encarnação, do qual não temos que nos ocupar aqui, e que será examinado ulteriormente.
    Nota da E ditora: Kardec, em vida, não pôde cumprir esta promessa, visto que, no ano seguinte, ao dar publicação a esta obra, foi chamado à Pátria E spiritual.
    (KAR DE C , 2007e, p. 400-403).
    Continua, Kardec:
    66. Aos fatos materiais juntam-se fortíssimas considerações morais.
    S e as condições de J esus, durante a sua vida, fossem as dos seres fluídicos, ele não teria experimentado nem a dor, nem as necessidades do corpo. S upor que assim haja sido é tirar-lhe o mérito da vida de privações e de sofrimentos que escolhera, como exemplo de resignação. S e tudo nele fosse aparente, todos os atos de sua vida, a reiterada predição de sua morte, a cena dolorosa do J ardim das Oliveiras, sua prece a Deus para que lhe afastasse dos lábios o cálice de amarguras, sua paixão, sua agonia, tudo, até ao último brado, no momento de entregar o E spírito, não teria passado de vão simulacro, para enganar com relação à sua natureza e fazer crer num sacrifício ilusório de sua vida, numa comédia indigna de um homem simplesmente honesto, indigna, portanto, e com mais forte razão de um ser tão superior. Numa palavra: ele teria abusado da boafé dos seus contemporâneos e da posteridade. Tais as consequências lógicas desse sistema, consequências inadmissíveis, porque o rebaixariam moralmente, em vez de o elevarem. (1)
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    (1) Nota da E ditora: Diante das comunicações e dos fenômenos surgidos após a partida de Kardec, concluiu-se que não houve realmente vão simulacro, como igualmente não houve simulacro de J esus, após a sua morte, ao pronunciar as palavras que foram registradas por Lucas (24:39): — “S ou eu mesmo, apalpai-me e vede, porque um E spírito não tem carne nem osso, como vedes que eu tenho.”
    (KAR DE C , 2007e, p. 403, grifo do original).
    E arremata categórico: “Jesus, pois, teve, como todo homem, um corpo carnal e um corpo fluídico, o que é atestado pelos fenômenos materiais e pelos fenômenos psíquicos que lhe assinalaram a existência”. (KARDEC, 2007e, p. 403).
    Portanto, não dá para conciliar a obra Os Quatro Evangelhos de Roustaing, com o que Kardec desenvolve na codificação da Doutrina Espírita, especialmente no que diz respeito do corpo de Jesus. E chamamos a atenção para o fato de que o livro A Gênese foi lançado depois da obra de Roustaing.
    Talvez a maioria dos espíritas nem saiba, mas Kardec fez uma análise dessa obra. Vamos encontrá-la na Revista Espírita, relativa ao mês de junho de 1866, que vale a pena colocarmos neste estudo, para que tenhamos um esclarecimento maior do assunto.
    Passaremos, então, a palavra a Kardec, no texto intitulado “Os Evangelhos Explicados” – Pelo Sr. Roustaing[1], onde ele comenta os recém-lançados livros:
    E sta obra compreende a explicação e a interpretação dos E vangelhos, artigo por artigo, com ajuda de comunicações ditadas pelos E spíritos. É um trabalho considerado, e que tem, para os E spíritas, o mérito de não estar, sobre nenhum ponto, em contradição com a doutrina ensinada por O Livro dos E spíritos e o dos Médiuns. As partes correspondentes àquelas que tratamos em O E vangelho S egundo o E spiritismo o são num sentido análogo. De resto, como nos limitamos às máximas morais que, quase sem exceção, são geralmente claras, elas não poderiam ser interpretadas de diversas maneiras; também foram o assunto de controvérsias religiosas. Foi por esta razão que começamos por ali a fim de ser aceito sem contestação, esperando para o resto que a opinião geral estivesse mais familiarizada com a ideia espírita.
    O autor desta nova obra acreditou dever seguir um outro caminho; em lugar de proceder por graduação, quis alcançar o objetivo de um golpe. Tratou, por certas ques tões que não julgamos oportuno abordar ainda, e das quais, consequentemente, lhe deixamos a responsabilidade, ass im como aos E spíritos que os comentaram. C onsequente com o nosso princípio, que consiste em regular a nossa caminhada sobre o desenvolvimento da opinião, não daremos, até nova ordem, às suas teorias, nem aprovação, nem desaprovação, deixando ao tempo o cuidado de sancioná-las ou de contradizê-las. C onvém, pois, considerar essas explicações como opiniões pessoais aos E spíritos que as formularam, opiniões que podem ser jus tas ou falsas, e que, em todos os casos, têm necessidade da sanção do controle universal, e até mais ampla confirmação não poderiam ser consideradas como partes integrantes da Doutrina E spírita.
    Quando tratarmos essas questões, o faremos sem cerimônia; mas é que, então, teremos recolhido os documentos bastante numerosos, nos ensinos dados de todos os lados pelos E spíritos, para poder falar afirmativamente e ter a certeza de estar de acordo com a maioria; é assim que fazemos todas as vezes que se trata de formular um princípio capital. Nós os dissemos cem vezes, para nós a opinião de um E spírito, qualquer que seja o nome que traga, não tem senão o valor de uma opinião individual; nosso critério está na concordância universal, corroborada por uma rigorosa lógica, para as coisas que não podemos controlar por nossos próprios olhos. De que nos serviria dar prematuramente uma doutrina como uma verdade absoluta, se, mais tarde, ela devesse ser combatida pela generalidade dos E spíritos?
    Dissemos que o livro do S r. R oustaing não se afasta dos princípios de O Livro dos E spíritos e o dos Médiuns; nossas observações levam, pois, sobre aplicação desses mesmos princípios à interpretação de certos fatos. É assim, por exemplo, que dá ao C risto, em lugar de um corpo carnal, um corpo fluídico concretizado, tendo todas as aparências da materialidade, e dele faz uma agênere. Aos olhos dos homens que não teriam podido compreender, então, sua natureza espiritual, teve que passar E M APAR Ê NC IA, essa palavra é incessantemente repetida em todo o curso da obra, para todas as vicissitudes da Humanidade. Assim se explicaria o mistério de seu nascimento: Maria não teria tido senão as aparências da gravidez. E ste ponto, colocado por premissa e pedra angular, é a base sobre a qual se apoia para explicação de todos os fatos extraordinários ou miraculosos da vida de J esus.
    S em dúvida, não há aí nada de materialmente impossível para quem conhece as propriedades do envoltório perispiritual; sem nos pronunciar pró ou contra essa teoria diremos que ela é ao menos hipotética, e que, se um dia ela fosse reconhecida errada, a base sendo falsa, o edifício desmoronaria. E speramos, pois os numerosos comentários que ela não deixará de provocar da parte dos E spíritos, e que contribuirão para elucidar a questão. S em prejulgá-la, diremos que já foram feitas objeções sérias a essa teoria, e que, na nossa opinião, os fatos podem perfeitamente se explicar sem sair das condições da Humanidade corpórea.
    E stas observações, subordinadas à sanção do futuro, não diminui nada a importância dessa obra que, ao lado das coisas duvidosas do nosso ponto de vista, delas encerra, incontestavelmente, boas e verdadeiras, e será consultada proveitosamente pelos E spíritas sérios.
    S e o fundo de um livro é o principal, a forma não é de se desdenhar, e entra também por alguma coisa no sucesso. Achamos que certas partes são desenvolvidas muito longamente, sem proveito para a clareza. Na nossa opinião, se, limitando-se ao estrito necessário, ter-se-ia podido reduzir a obra em dois, ou mesmo em um único volume, teria ganhado em popularidade. (KAR DE C , 1993i, p. 190-192, grifo nosso).
    Podemos muito bem perceber que Kardec, embora não condene de todo a obra de Roustaing, deixa aberto para o futuro o julgamento. Porém, quanto à questão do corpo fluídico, não deixa de dar sua opinião de que não sancionava essa hipótese, também não deixa de falar da falta de clareza e de objetividade da obra.
    Diz, de forma bastante clara, que a obra de Roustaing, por falta de uma confirmação mais ampla, não poderia ser considerada como parte integrante da Doutrina Espírita.
    Pensamos que pelo fato da FEB ter editado Os Quatro Evangelhos dá a nítida impressão de que a aprova, mesmo ela tendo pontos contrários à Doutrina, o que é lamentável por tratar-se de um órgão instituído para coordenar O Movimento Espírita que, acima de tudo, deveria estar sintonizado com o pensamento do codificador.
    Julgamos que a FEB, através de seus dirigentes, deveria dar um esclarecimento objetivo a respeito disso, explicando doutrinariamente o porque publica essa obra. Como cabe a ela defender-se, passamos a palavra a FEB, para que, por dever de ofício, se pronuncie a respeito e esclareça qual é realmente a sua posição ante Os Quatro Evangelhos, para que não leve as pessoas a pensarem erroneamente a respeito dos pontos, claramente, antidoutrinários que nela se advoga, considerando o que sugere Kardec:
    E stas observações, subordinadas à sanção do futuro, não diminui nada a importância dessa obra que, ao lado das coisas duvidosas do nosso ponto de vista, delas encerra, incontestavelmente, boas e verdadeiras, e será consultada proveitosamente pelos E spíritas sérios. (KAR DE C , 1993i, p. 192, grifo nosso).
    Não podemos deixar de lembrar que se a obra de Roustaing é a “Revelação da Revelação”, então, toda a obra de Kardec fica em posição inferior, o que, obviamente, não faz sentido, porquanto, dois fatos nos chamam a atenção; o primeiro é que os Espíritos Superiores informaram a Kardec que ele voltaria em breve, ou seja, reencarnaria, para completar sua obra, portanto a previsão é que de o próprio Kardec completaria a sua obra, e o segundo é que se João Evangelista aparece entre os Espíritos envolvidos com a codificação espírita, por que motivo ele não avisou a Kardec que para o complemento do “edifício” seria utilizada uma outra pessoa, no caso o Sr. Roustaing?
    Hoje, particularmente, possuímos informações que nos faz ter sérias reservas contra Os quatro Evangelhos; uma delas, a que mais sobressai, é afirmação de Roustaing que:
    [… ] o apóstolo Mateus, Marcos, discípulo do apóstolo Pedro, Lucas, discípulo do apóstolo Paulo, e o apóstolo J oão, que se haviam encarnado em missão para esse propósito, já tinham escrito os E vangelhos, sob a influência e inspiração dos E spíritos do S enhor [… ]. (R OUS TAING, 1999, p. 84, grifo nosso).
    Os evangelistas eram, sem o saberem, médiuns historiadores inspirados,
    [… ]. (R OUS TAING, 1999, p. 127, grifo nosso.)
    Ora, estudiosos e críticos bíblicos da atualidade nos informam que os nomes constantes nos títulos dos Evangelhos – Mateus, Marcos, Lucas e João –, não designam seus autores ([2]), portanto, não condiz com o que se afirma nas obras de Roustaing.
    Especificamente, no caso de João Evangelista, suposto autor do quarto Evangelho, é informado, em Atos dos Apóstolos, que tanto ele quanto Simão Pedro eram “homens iletrados e incultos” (At 4,13).
    Mas, voltando ao nosso assunto inicial sobre Moisés ter sido Elias e posteriormente João Batista, como ainda não houve o “controle universal”, proposto por Kardec, e por não ter como se considerar como parte integrante da Doutrina Espírita, preferimos ficar somente com o fato de João Batista ter sido Elias, já que, além de ser uma afirmativa de Jesus, foi dito também por vários outros Espíritos.
    Agora, vamos analisar a questão da aparição de Moisés e Elias a Jesus, no monte Tabor. Na narrativa de Mateus (17,1-9) está dito que eles conversavam com Jesus, e Lucas (9, 28-36), detalha dizendo que o assunto era sobre a partida de Jesus que se realizaria em Jerusalém. Colocando tudo isso sob um raciocínio lógico e, no pressuposto de que um desses Espíritos esteja substituindo um outro, realmente não compreendemos, pois, segundo está sendo dito, Moisés e Elias são a mesma individualidade; então qual a razão de um Espírito aparecer junto com outro qualquer que lhe toma a aparência, já que, no fundo, ambas aparições estão a representar uma mesma pessoa? Se eles fossem realmente um, deveria, por força da lógica, haver somente a aparição de um só Espírito, uma vez que o próprio interessando já estava pessoalmente lá.
    E mais: não há como afastarmos, nem um milímetro, do pensamento de Kardec, quando ele diz: “para nós a opinião de um Espírito, qualquer que seja o nome que traga, não tem senão o valor de uma opinião individual; nosso critério está na concordância universal, corroborada por uma rigorosa lógica”. (KARDEC, 1993i, p. 191, grifo nosso). Acreditamos que isso também deve ser aplicado para opinião de qualquer espiritista ou entidade representativa do Movimento Espírita.
    Paulo da Silva Neto Sobrinho Agosto/2002.
    (Versão 5 – revisão mai/2016)
    Referências bibliográficas:
    MACHADO, I. P. Êxodo. Brasília: Recanto, 2002.
    KARDEC, A. A Gênese. Araras, SP: IDE,1993.
    KARDEC, A. Revista Espírita 1866, tomo IX. Araras, SP: 1993i.
    ROUSTAING, J. B. Os quatro evangelhos. Vol. 1. Rio de Janeiro: FEB, 1999.



    [1] Os quatro Evangelhos, seguidos dos mandamentos explicados em espírito e verdade pelos evangelistas assistidos pelos apóstolos. Recolhidos e colocados em ordem por J. B. Roustaing, advogado da corte imperial de Bordeaux, antigo chefe da ordem dos advogados – 3 vol. In-12 – Preço 10 fr. 50. Paris, Livraria Central, 24, bulevarde dos Italianos – Bordeaux, todas as livrarias. (nota de Kardec).
    [2] NETO S OBRINHO, P. S . Os nom es dos títulos dos Ev angelhos designam seus autores?, disponível em : http://www.paulosnetos.net/viewdownload/7-assuntos-biblicos/405-os-nom es-dos-titulos-dos-evang elhos desig nam -seus-autores