Devemos amar os criminosos, como criaturas de Deus, “às quais o perdão e a misericórdia serão concedidos, se se arrependerem”(1) como também a nós, pelas faltas que cometemos contra sua lei. Não nos cabe dizer de um criminoso: é “um miserável; deve-se expurgar da terra; não é assim que nos compete falar. Que diria Jesus, se visse junto de si um desses desgraçados? Lamentá-lo-ia; considerá-lo-ia um doente bem digno de piedade; estender-lhe-ia a mão. Em realidade, não podemos fazer o mesmo; mas, pelo menos, podemos orar por ele.”(2)
Infelizmente noticia-se, às vezes, pela mídia em geral, a tortura física e psicológica, nos presídios e penitenciarias , como uma das barbaridades cometidas em nome do Estado e da lei.
Kardec, preocupado com as graves questões sociais, expressou sua inquietude na pergunta 807 do Livro dos Espíritos, sobre o que se deve pensar dos que abusam da superioridade de suas posições sociais, para, em proveito próprio, oprimir os fracos. "Merecem anátemas!", responderam os luminares do além, que ainda acrescentam: "Ai deles! Serão, a seu turno, oprimidos e renascerão numa existência em que terão de sofrer tudo o que tiverem feito sofrer os outros".(3)
Se verdadeiras as agressões de agentes de segurança aos presos, e ocorrendo as muitas defecções morais cometidas pelos chamados homens "livres", enchafurdados em seus interesses espúrios, a síndrome da violência inverte a situação de tal forma que os agentes de segurança passam a ser os controlados e vigiados e os encarcerados se mantêm deixados em sua "independência". Os criminosos enclausurados se fortalecem psicologicamente e passam a perseguir e a assassinar, sem limites, os agentes do estado.
Observamos ondas de ódios e violências sem precedentes. Testemunhamos muitas vezes, pela imprensa, os mais dantescos episódios de combate entre criminosos e policiais.
O sistema carcerário mantém juntos o criminoso reincidente e o primário nas cadeias; os criminosos de periculosidades diversas convivem no mesmo espaço, o que tem contribuído para o acréscimo da violência entre eles e dá acolhimento à revolta, além de dificultar a possível recuperação do indivíduo. Em outras palavras, o preso menos violento, dificilmente será o mesmo após um estágio numa penitenciária.
Nessa estranha panorâmica, percebemos que a brutalidade humana tem esmaecido o caminho para Deus. Destarte, torna-se imprescindível praticarmos o Evangelho nos vários setores do campo social, contribuindo com a parcela de mansidão para pacificá-la. O homem moderno ainda não percebeu que somente a experiência do Evangelho pode estabelecer as bases da concórdia, da fraternidade e constituir os antídotos eficazes para minimizar a violência que ainda avassala a Terra.
Recordemos Jesus e Suas considerações sobre a prática de um sublime código de caridade, ante as questões da vida dos encarcerados: "Senhor, quando foi que te vimos preso e não te assistimos?". Ao que Ele respondera: "Em verdade vos digo - todas as vezes que faltastes com a assistência a um destes mais pequenos, deixastes de tê-la para comigo mesmo.".(4) Alguém disse certa vez que se abrirmos um ovo choco, sentiremos nojo pelo mau odor exalado por aquela parte viscosa. No entanto, o que nos parece podridão naquela substancia é, apenas, transformação, ou seja, é o berço de uma nova vida que aparecerá, em breve, repetindo na candura e beleza - sempre suaves - do pintinho, que surgirá da intimidade do ovo. Situação idêntica, o homem. Se analisado em seus pendores, parecerá pouco atraente e até repugnante, quando mergulhado no crime. Se buscarmos um ponto de analogia, percebemos que, de certa maneira, também estamos em processo de gestação no útero da sociedade.
Do mais insignificante ser humano até Deus existe uma corrente na qual nos colocamos como elos inquebrantáveis. Logo, nenhum elo existe que esteja desligado e sem amparo Dele. O que existe é: diferença no volume e na qualidade do amparo. Na verdade, o homem cresce e se expande na medida em que se projeta no coração do semelhante. Assim, a realização de qualquer investimento de solidariedade, ante os presos de menor ou maior periculosidade, se consubstanciará no mais eloquente ato cristão.
Jorge Hessen
jorgehessen@gmail.com
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Referências bibliográficas:
(1) Karde, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Caridade ara com os criminosos, instruções de Elisabeth de France (Havre, 1862), Rio de Janeiro: Ed FEB, 2000, Cap. 11
(2) idem
(3) Kardec, Allan. O Livros dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1999, perg 807
(4) Mt 25:31-46